TSE confirma Adail Filho fora da prefeitura de Coari após decisão sobre terceiro mandato

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) reconheceu, nesta quarta-feira (28), o terceiro mandado de Adail Pinheiro Filho em Coari. O ato confirma decisão unânime do Tribunal Regional Eleitoral do Amazonas (TRE-AM).

Em decisão monocrárica, o Ministro Tarcisio Vieira negou seguimento ao recurso de Adail, que agora esta definitivamente fora da Prefeirura de Coari.

A Decisão é relativa ao Recurso Especial Eleitoral Nº 0600296-31.2020.6.04.0008 (PJe) – COARI – Amazonas, que teve como relator o ministro Tarcísio Vieira Figueiredo Pinheiro

Confira a Decisão na íntegra:

RELATOR: MINISTRO TARCISIO VIEIRA DE CARVALHO NETO
RECORRENTE: ADAIL JOSE FIGUEIREDO PINHEIRO, KEITTON WYLLYSON PINHEIRO BATISTA
Advogados do(a) RECORRENTE: MARCOS DOS SANTOS CARMO FILHO – AM0006818, NEY BASTOS SOARES JUNIOR – AM0004336, DANIEL FABIO JACOB NOGUEIRA – AM0003136
Advogados do(a) RECORRENTE: LUIS GUSTAVO MOTTA SEVERO DA SILVA – PR0044980, MAYARA DE SA PEDROSA – DF0040281
RECORRIDO: RAIONE CABRAL QUEIROZ, COLIGACAO FICHA LIMPA PARA COARI, ROBSON ROBERTO TIRADENTES JUNIOR
Advogado do(a) RECORRIDO: RONALDO LAZARO TIRADENTES – AM4113
Advogados do(a) RECORRIDO: RONALDO LAZARO TIRADENTES – AM4113, LEONARDO PRESTES MARTINS – AM0001277
Advogado do(a) RECORRIDO: RONALDO LAZARO TIRADENTES – AM4113

DECISÃO

ELEIÇÕES 2020. REGISTRO DE CANDIDATURA. PREFEITO ELEITO. RECURSOS ESPECIAIS. DESNECESSIDADE DE EXAMINAR TODAS AS TESES LEVANTADAS. INELEGIBILIDADE DO ART. 14, §§ 5º E 7º, DA CRFB. GENITOR À FRENTE DA PREFEITURA EM 2012. REGISTRO INDEFERIDO POSTERIORMENTE. CASSAÇÃO APÓS MAIS DE 2 (DOIS) ANOS DO INÍCIO DO MANDATO. EFETIVO EXERCÍCIO PARA FINS DE INELEGIBILIDADE REFLEXA DO FILHO REELEITO EM 2020. NEGATIVA DE SEGUIMENTO.

1. Inexistência de violação aos arts. 275 do CE e 1.022 do CPC, uma vez que deve o julgador apenas enfrentar as questões capazes de infirmar a conclusão adotada na decisão, sem que haja a necessidade de examinar todas as teses levantadas pelo jurisdicionado.

2. A questão jurídica a ser dirimida é saber se o filho, eleito prefeito em 2016, pode concorrer à reeleição em 2020 na hipótese de seu pai ter assumido a chefia da prefeitura em 2012, com registro de candidatura pendente de apreciação definitiva e posteriormente indeferido em 2015, o que acarretou a assunção do segundo colocado para o período remanescente, conforme entendimento aplicado à época.

3. A leitura do art. 14, §§ 5º e 7º, da CRFB é no sentido de que a norma visa evitar a formação de grupos hegemônicos que, monopolizando o acesso aos mandatos eletivos, virtualmente patrimonializam o poder governamental, convertendo-o numa inadmissível inversão dos postulados republicanos, em verdadeira res domestica. Precedente.

4. O fato é que o genitor do prefeito reeleito no pleito de 2020 exerceu a titularidade da chefia do Executivo municipal na primeira metade do mandato atinente às eleições de 2012. Ainda que o TSE tenha indeferido seu registro de candidatura em 2015, o que ensejou à época a assunção do segundo colocado, não há como afastar a realidade, que foi a de efetivo exercício da titularidade da prefeitura.

5. A assunção da chefia do Executivo pelo candidato eleito, sejam quais forem a circunstância e o lapso temporal transcorrido, é considerada efetivo exercício de mandato, de forma a impedir a reeleição, bem como a perpetuação de grupos familiares no poder.

6. Negado seguimento aos recursos especiais eleitorais.

Trata-se, na origem, de impugnação ao registro de candidatura proposta pela Coligação Ficha Limpa para Coari e notícias de inelegibilidade apresentadas por Raione Cabral Queiroz e Rafael de Souza Rosário em face de Adail José Figueiredo Pinheiro, prefeito eleito de Coari/AM, em razão da inelegibilidade prevista no art. 14, §§ 5º e 7º, da CRFB.

Em primeira instância, os pedidos foram julgados improcedentes, com reforma da sentença pelo Tribunal Regional Eleitoral do Amazonas (TRE/AM), que proveu o recurso interposto pela Coligação Ficha Limpa para Coari e por Robson Roberto Tiradentes Júnior em acórdão assim ementado:

RECURSO ELEITORAL. REGISTRO DE CANDIDATURA. ELEIÇÕES 2020. RECORRENTE QUE APRESENTOU NOTÍCIA DE INELEGIBILIDADE. AUSÊNCIA DE LEGITIMIDADE RECURSAL. JUNTADA DE DOCUMENTO NA FASE RECURSAL. POSSIBILIDADE. PARECER MINISTERIAL APRESENTADO FORA DO PRAZO. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. INELEGIBILIDADE REFLEXA. ART. 14, § 7º, DA CF. PERPETUAÇÃO DO PODER EM GRUPO FAMILIAR. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

I – Embora ao eleitor seja possível noticiar o fato que sirva de substrato ao indeferimento do pedido de registro de candidatura, não lhe é conferida a legitimidade para recorrer contra a decisão que defere referida pretensão. Precedente do TSE.

II – Em se tratando de registro de candidatura, é pacífico nesta Corte o entendimento no sentido da possibilidade, nesta instância ordinária, da juntada de documentos na fase recursal, ainda que já ultrapassado o momento oportuno.

III – A apresentação do parecer ministerial fora do prazo não importa em prejuízo à parte.

IV – A cassação do titular ante a prática de ilícitos eleitorais, independentemente do momento em que venha a ocorrer, não têm o condão de descaracterizar o efetivo desempenho do mandato, circunstância que deve ser considerada para fins de incidência das inelegibilidades constitucionais encartadas no art. 14, §§ 5º e 7º, da Constituição Federal.

V – Recurso conhecido e provido. (ID nº 118304738)

Opostos e rejeitados os embargos de declaração (ID nº 118305138 e nº 118305738).

Em recurso especial eleitoral (ID nº 118306138), Keitton Wyllyson Pinheiro Batista, vice-prefeito eleito no Município de Coari/AM, entende ter ocorrido violação aos arts. 275 do Código Eleitoral e 1.022 do Código de Processo Civil. Argumenta que a assunção sub judice do genitor do recorrido, de maneira precária e efêmera, não gera a inelegibilidade do art. 14, §§ 5º e 7º, da Constituição da República. Sustenta a divergência jurisprudencial, apontando como paradigma o AgR-AI nº 64-37/PE (Rel. Min. Admar Gonzaga, DJe de 7.5.2018).

Adail José Figueiredo, em seu recurso especial (ID nº 118306388), afirma que, “ao mesmo tempo que nenhum precedente do Tribunal Superior Eleitoral se aplica textualmente ao caso em debate, existe, de outro lado, uma resposta a consulta pelo Tribunal Regional Eleitoral do Amazonas que se adequa quase que à perfeição à hipótese em debate”. Sustenta que, na origem, suscitou a argumentação no sentido da precariedade da assunção do genitor, de maneira que não houve inovação de defesa em sede recursal. Argumenta que houve, no caso, “ruptura no exercício do poder do grupo familiar”, o que afasta a inelegibilidade do art. 14, §§ 5º e 7º, da Constituição da República.

Contrarrazões da Coligação Ficha Limpa para Coari e de Robson Roberto Tiradentes Júnior no ID nº 118306488.

Parecer da Procuradoria-Geral Eleitoral pelo desprovimento dos recursos especiais (ID nº 129177238).

É o relatório do necessário.

Decido.

Conforme moldura fática extraída do acórdão de origem, Manoel Adail Amaral Pinheiro, genitor do recorrente, sagrou-se vencedor nas eleições de 2012, tendo exercido o cargo de prefeito do Município de Coari/AM entre 2013 e 2015, quando teve seu registro de candidatura indeferido e o diploma cassado.

Como consequência, assumiu a cadeira a oposição, segunda colocada no pleito, que finalizou o mandato até 2016, ocasião em que Adail José Figueiredo Pinheiro, filho do prefeito cassado em 2015, foi eleito para a chefia da municipalidade e, nas eleições de 2020, obteve sucesso na reeleição.

Na origem, o TRE/AM entendeu que o mandato de prefeito exercido pelo recorrente, de 2017 a 2020, deve ser compreendido como o segundo mandato do grupo familiar, o que impediria sua reeleição, tendo em vista que seu pai esteve à frente da prefeitura entre 2013 e 2015.

Em suma, a questão jurídica a ser dirimida é saber se o filho, eleito prefeito em 2016, pode concorrer à reeleição em 2020 na hipótese de seu pai ter assumido a chefia da prefeitura em 2012, com registro de candidatura pendente de apreciação definitiva e posteriormente indeferido em 2015, o que acarretou a assunção do segundo colocado para o período remanescente, conforme entendimento aplicado à época.

Estabelecida a premissa fática e posto o quadro jurídico, debruço-me, um a um, sobre os argumentos trazidos nos recursos especiais.

De início, em ambas as insurgências, constam alegações de violação aos arts. 275 do Código Eleitoral e 1.022 do Código de Processo Civil, que merecem o afastamento.

Afirmam que a assunção do genitor do prefeito eleito ocorreu de forma precária, sub judice. Além disso, expõem que sua permanência à frente da chefia do Executivo se deu apenas até 8.2.2014, quando se afastou do cargo por razões não eleitorais. No dia seguinte, portanto, a prefeitura foi assumida pelo vice-prefeito, que permaneceu até 15.4.2015, data em que este Tribunal Superior finalizou o julgamento do registro de candidatura, com posse à chapa segunda colocada no pleito.

Nesse sentido, defendem que houve omissão não sanada na origem, a despeito da oposição de embargos de declaração, sobre o caráter sub judice do mandato exercido pelo genitor, sobre o período efêmero de duração do mandato e sobre a ruptura da continuidade administrativa do grupo familiar. A argumentação é posteriormente repisada também como matéria central do recurso.

No julgamento dos embargos de declaração opostos na origem, afirmou-se que a alegada omissão quanto ao caráter sub judice do mandato exercido pelo genitor foi tema inaugurado em sede de aclaratórios, o que de fato ocorreu, mesmo porque, “em nenhum momento de suas contrarrazões (id 6657306) – momento oportuno para tanto –, Adail José de Figueiredo Pinheiro suscitou a questão de que o caráter sub judice do mandato exercido por seu pai descaracterizaria a inelegibilidade reflexa do artigo 14, §§ 5º e 7º, da Constituição Federal” (ID nº 118305888).

A dinâmica processual elucida a questão, uma vez que o registro foi deferido em primeira instância e o recurso ofertado foi com a defesa da tese da ocorrência da inelegibilidade reflexa do art. 14, § 7º, da Constituição Federal. Em embargos, portanto, defende-se que houve o prequestionamento do tema em sede de contrarrazões ao recurso eleitoral.

Com essa moldura fática cristalizada, contudo, não é possível revisitar os autos para traçar conclusão diversa em sede especial, de maneira que deveria o recorrente ter embargado novamente o acórdão de origem para esclarecer o ponto. De toda forma, em recurso especial, argumenta-se que o tema foi, sim, suscitado em contrarrazões, com prints da peça ao longo da insurgência especial. Nas referidas imagens, não obstante, consta que a tese agitada foi a de ruptura do exercício do poder do grupo familiar, conforme ID nº 118306388, e não a de precariedade da assunção sub judice.

No tópico, ademais, ainda que superados os óbices processuais, entendo não ter ocorrido nenhum vício na origem porque o TRE/AM aplicou a norma à espécie de forma clara, com a adoção de tese que afasta a subsistência de quaisquer dos argumentos acima expostos.

Consoante voto do relator na origem, o indeferimento do registro da candidatura do recorrente ocorreu porque seu genitor já havia exercido o mandato entre 2013 e 2015. Adotou-se, como fundamento, o que assentado na Cta nº 117-26/DF (Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 12.9.2016), segundo a qual a cassação do titular, independentemente do momento em que venha a ocorrer, não descaracteriza o efetivo desempenho do mandato, o que deve ser levado em consideração para fins da leitura do art. 14, §§ 5º e 7º, da Constituição Federal.

Como se vê, no Tribunal de origem, assentou-se a premissa de que o genitor do recorrente assumiu a titularidade da chefia do Executivo em razão das eleições de 2012, tendo sido cassado posteriormente. Ainda assim, nenhuma “decisão judicial que anule a diplomação tem o condão de modificar essa realidade nem de infirmar os seus efeitos para fins de inelegibilidade” (ID nº 118304888), como consta no voto-vista prolatado no âmbito do TRE/AM.

Nesse sentido, torna-se indiferente a análise das teses atinentes à natureza sub judice da assunção, ao período efêmero ou não de permanência na titularidade do poder e à quebra ou não da continuidade administrativa do grupo familiar, mesmo porque são todos argumentos insuficientes para infirmar a conclusão estabelecida.

A esse respeito, é de se rememorar que a Justiça Eleitoral, em sede jurisdicional, não é órgão de consulta, como já afirmado por esta Corte no AgR-REspe nº 26-38/RO (Rel. Min. Admar Gonzaga, DJe de 31.10.2018). Com efeito, deve o julgador apenas enfrentar as questões capazes de infirmar a conclusão adotada na decisão, sem que haja a necessidade de examinar todas as teses levantadas pelo jurisdicionado. O entendimento, mesmo após o Código de Processo Civil de 2015, é tranquilo nesse sentido: STJ, EDcl-MS nº 21.315/DF, Rel. Min. Diva Malerbi (Desembargadora convocada TRF 3ª Região), Primeira Seção, DJe de 15.6.2016.

Adail José Figueiredo, em seu recurso especial (ID nº 118306388), também afirma que, “ao mesmo tempo que nenhum precedente do Tribunal Superior Eleitoral se aplica textualmente ao caso em debate, existe, de outro lado, uma resposta a consulta pelo Tribunal Regional Eleitoral do Amazonas que se adequa quase que à perfeição à hipótese em debate”.

A tese não comporta maiores digressões, mesmo porque o pronunciamento de origem assentou-se em precedentes oriundos do Tribunal Superior eleitoral e do Supremo Tribunal Federal para solucionar a questão.

Diante do contexto emoldurado, não há como empregar solução diversa ao presente caso.

O fato é que o genitor do prefeito reeleito no pleito de 2020 exerceu a titularidade da chefia do Executivo municipal na primeira metade do mandato atinente às eleições de 2012. Ainda que o TSE tenha indeferido seu registro de candidatura em 2015, o que ensejou à época a assunção do segundo colocado, não há como afastar a realidade, que foi a de efetivo exercício da titularidade da prefeitura.

Entendo que a leitura do art. 14, § 7º, da Constituição Federal não comporta a adoção de critérios subjetivos, o que confere maior segurança jurídica em sua aplicação. Nesse sentido, mesmo que haja o falecimento, a separação, ou outras causas supervenientes, não é possível desconsiderar a assunção da titularidade da chefia do Executivo pelo primeiro membro do grupo familiar. Confira-se o entendimento do Supremo Tribunal Federal acerca da matéria:

Ementa: AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. ELEITORAL. CAUSA DE INELEGIBILIDADE. VEDAÇÃO AO EXERCÍCIO DE TERCEIRO MANDATO ELETIVO PARA CARGO DE CHEFIA DO PODER EXECUTIVO PELO MESMO GRUPO FAMILIAR. REGIME JURÍDICO DAS INELEGIBILIDADES. INTERPRETAÇÃO CONSTRUTIVA. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. ADOÇÃO DE CRITÉRIOS OBJETIVOS PARA CONFIGURAÇÃO DO TERCEIRO MANDATO DO MESMO GRUPO FAMILIAR. SEGURANÇA JURÍDICA NO PROCESSO ELEITORAL. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

I – A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal entende ser legítima a “interpretação construtiva” das causas de inelegibilidade constantes na Constituição Federal, quando amparada pelo Princípio Republicano da alternância no Poder. Precedentes.

II – A aplicação da causa de inelegibilidade da vedação ao exercício de terceiro mandato eletivo para o cargo de chefia do Poder Executivo pelo mesmo grupo familiar exige a adoção de critérios objetivos para sua aferição, bastando, para tanto, a verificação do vínculo familiar, nos termos do art. 14, § 7º, da CF/1988, independentemente da ocorrência de separação conjugal, falecimento, ou outras possibilidades supervenientes à posse do primeiro familiar na chefia do Poder Executivo, de modo a conferir maior segurança jurídica ao processo eleitoral no momento do registro de candidaturas.

III – As causas de natureza eleitoral são isentas da fixação de custas ou honorários por serem necessárias ao exercício da cidadania (art. 5º, LXXVII, da CF/1988).

IV – Agravo regimental a que se nega provimento.

(STF, AgR-RE nº 1028577/RJ, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, DJe de 29.3.2019 – grifei)

Veja-se que, mesmo na hipótese de mandato-tampão, inexiste tratamento diferenciado ao mandato regular para fins de leitura do art. 14, §§ 5º e 7º, da Constituição da República, como expôs o Ministro Celso de Mello no AgR-RE nº 1128439/RN (Segunda Turma, DJe de 13.12.2018). Na oportunidade, rememorou-se a teleologia dos preceitos constitucionais, voltados a evitar a “formação de grupos hegemônicos que, monopolizando o acesso aos mandatos eletivos, virtualmente patrimonializam o poder governamental, convertendo-o, numa inadmissível inversão dos postulados republicanos, em verdadeira ‘res domestica’”.

Nesse sentido, o Tribunal Superior Eleitoral, em resposta à consulta formulada, já expôs que a cassação do titular, seja por qual motivo ocorrer, não descaracteriza o efetivo desempenho do mandato, por isso se torna irrelevante a análise, no caso concreto, de contextos fáticos específicos atinentes à alegada ruptura da continuidade administrativa do grupo familiar. Confira-se:

CONSULTA. INELEGIBILIDADE. ART. 14, §§ 5º E 7º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. PREFEITO. CASSAÇÃO. DESEMPENHO DO PRIMEIRO ANO DO QUADRIÊNIO. ELEIÇÃO SUPLEMENTAR. COMPLEMENTAÇÃO DO MANDATO. PESSOA ALHEIA AO NÚCLEO FAMILIAR. QUADRIÊNIO SUBSEQUENTE. ASSUNÇÃO. CHEFIA DO EXECUTIVO MUNICIPAL. PARENTE CONSANGUÍNEO EM SEGUNDO GRAU DO PREFEITO CASSADO. REELEIÇÃO CONFIGURADA. MESMO GRUPO FAMILIAR. VEDAÇÃO DE EXERCÍCIO DE TERCEIRO MANDATO.

1. O art. 14, §§ 5º e 7º, da Lei Fundamental, segundo a sua ratio essendi, destina-se a evitar que haja a perpetuação ad infinitum de uma mesma pessoa ou de um grupo familiar na chefia do Poder Executivo, de ordem a chancelar um (odioso) continuísmo familiar na gestão da coisa pública, amesquinhando diretamente o apanágio republicano de periodicidade ou temporariedade dos mandatos político-eletivos.

2. Os §§ 5º e 7º do art. 14 da CRFB/88, compõem a mesma equação legislativa, de vez que interligados umbilicalmente pela teleologia subjacente, de maneira que se faz necessária uma interpretação sistemática das disposições contidas nos §§ 5º e 7º do art. 14 da Constituição da República, no afã de (i) afastar a inelegibilidade do cônjuge e dos parentes consanguíneos ou afins, até o segundo grau, de Presidente da República, de Governador de Estado ou Território, do Distrito Federal e de Prefeito, para o mesmo cargo, quando o titular for reelegível e (ii) estender para o cônjuge e os parentes consanguíneos ou afins, até o segundo grau, dos ocupantes dos cargos ora ventilados, a vedação do exercício de terceiro mandato consecutivo nos mesmos cargos dos titulares.

3. A cassação do titular ante a prática de ilícitos eleitorais, independentemente do momento em que venha a ocorrer, não tem o condão de descaracterizar o efetivo desempenho de mandato, circunstância que deve ser considerada para fins de incidência das inelegibilidades constitucionais encartadas no art. 14, §§ 5º e 7º, da Constituição de 1988.

4. A eleição suplementar [rectius: renovação da eleição] tem mera aptidão de eleger candidato para ocupar o período remanescente do mandato em curso, até a totalização do quadriênio, não configurando, portanto, novo mandato, mas fração de um mesmo mandato.

5. No caso sub examine, verifica-se que o Prefeito “A” desempenhou o mandato referente ao quadriênio 2009-2012, e o seu parente em segundo grau, Prefeito “C”, assumiu a chefia do Poder Executivo no período de 2013-2016, de modo que, no segundo mandato, ficou caracterizada a reeleição e, em razão disso, atraiu-se a vedação de exercício de terceiro mandato consecutivo por esse núcleo familiar no mesmo cargo ou no cargo de vice-prefeito, ex vi do art. 14, §§ 5º e 7º, da Constituição da República.

6. Consulta respondida negativamente, porquanto o Prefeito “C” é inelegível para o desempenho do cargo de Chefe do Executivo municipal nas Eleições de 2016.

(Cta nº 117-26/DF, Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 12.9.2016 – grifei)

Há casos julgados nesta Corte em que se assentou que tampouco o falecimento do parente é capaz de afastar a inelegibilidade constitucional que impede a perpetuação de um mesmo grupo familiar no poder (REspe nº 111-30/RJ, Rel. Min. Henrique Neves da Silva, PSESS em 24.11.2016), entendimento elucidativo para fins do correto dimensionamento da proibição constante da Constituição da República. Confira-se, no mesmo sentido:

AGRAVOS REGIMENTAIS. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2012. PREFEITO. REGISTRO DE CANDIDATURA. INELEGIBILIDADE REFLEXA. ART. 14, §§ 5º E 7º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ÊX-CÔNJUGE ELEITO PREFEITO EM 2004. ÓBITO. AGRAVADA ELEITA NO MESMO MUNICÍPIO EM 2008. NOVA CANDIDATURA EM 2012. IMPOSSIBILIDADE. TERCEIRO MANDATO CONSECUTIVO. PROVIMENTO.

1. Considerando que o ex-cônjuge da agravada foi eleito em 2004 – vindo a falecer no curso do mandato – e que a agravada foi eleita para o mesmo cargo em 2008, é vedada sua candidatura à reeleição nas Eleições 2012, sob pena de configuração de terceiro mandato consecutivo do mesmo grupo familiar, nos termos da interpretação sistemática conferida por esta Corte ao art. 14, §§ 5º e 7º, da CF/88.

2. Agravos regimentais providos para indeferir o pedido de registro de candidatura de Yasnaia Pollyanna Werton Dutra ao cargo de prefeito do Município de Pombal/PB nas Eleições 2012.

(AgR-REspe nº 182-47/PB, Rel. Min. Dias Toffoli, Rel. designada Min. Nancy Andrighi, PSESS em 18.12.2012)

Ainda nessa linha de intelecção, há casos julgados envolvendo especificamente a hipótese de cassação do titular, todos no mesmo rumo atinente à impossibilidade de descaracterização do período como efetivo exercício da chefia do Executivo. Transcrevo ementas para corroborar tal compreensão:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PEDIDO DE REGISTRO DE CANDIDATURA. ELEIÇÕES 2008.

1. Conforme consignado na r. decisão agravada, o v. acórdão recorrido está em consonância com o atual entendimento desta c. Corte, segundo o qual o cônjuge ou parente de prefeito reeleito que teve o diploma cassado no segundo mandato não pode se candidatar ao pleito seguinte, sob pena de se configurar o exercício de três mandatos consecutivos por membros de uma mesma família (Precedentes: Cta nº 1.548/DF, Rel. Min. Marcelo Ribeiro, DJ de 15.5.2008; REspe nº 25.275/SP, Rel. Min. José Delgado, DJ de 9.6.2006; Cta nº 1.031/DF, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ de 28.6.2004; Cta nº 915, Rel. Min. Ellen Gracie Northfleet, DJ de 19.9.2003).

Agravo regimental não provido.

(REspe nº 319-79/RS, Rel. Min. Eliana Calmon, PSESS em 23.10.2008 – grifei)

CONSULTA. ELEIÇÕES 2008. CHEFE DO PODER EXECUTIVO. REELEIÇÃO. CASSAÇÃO NO CURSO DO SEGUNDO MANDATO. CANDIDATAR-SE AO MESMO CARGO NO MESMO MUNICÍPIO. IMPOSSIBILIDADE. TERCEIRO MANDATO. CONFIGURAÇÃO.

1. Prefeito reeleito em 2004, que teve seu mandato cassado no curso deste segundo mandato, fica impedido de se candidatar para o mesmo cargo e no mesmo município, no pleito de 2008, uma vez que tal hipótese configura um terceiro mandato consecutivo, vedado pelo § 5º do art. 14 da CF. Precedentes.

2. Consulta respondida negativamente.

(Cta nº 14-46/DF, Rel. Min. Eros Grau, DJ de 24.6.2008 – grifei)

Veja-se que o recorrente sustenta a divergência jurisprudencial, apontando como paradigma o AgR-AI nº 64-37/PE (Rel. Min. Admar Gonzaga, DJe de 7.5.2018). Não obstante, o contexto fático desse julgamento traz diversas peculiaridades que não se encaixam à presente hipótese, como a assunção do cargo pelo período de 8 (oito) meses por candidato não eleito e em cumprimento à decisão liminar que assim dispôs, bem como a anulação das eleições no local pelo Tribunal Superior Eleitoral, com aplicação do art. 224 do Código Eleitoral.

No caso dos autos, à época, ainda que o registro de candidatura do genitor do recorrente estivesse sub judice, sua assunção, na condição de candidato eleito, não ocorreu por força de decisão judicial precária. Some-se a tal fato que a definição do processo de registro, com a saída oficial do titular, ocorreu em abril de 2015, ou seja, praticamente 2 (dois) anos e meio após o pleito.

Do apanhado jurisprudencial colacionado, é possível atestar, em suma, que a assunção da chefia do Executivo pelo candidato eleito, sejam quais forem a circunstância e o lapso temporal transcorrido, é considerada efetivo exercício de mandato, de forma a impedir a reeleição, bem como a perpetuação de grupos familiares no poder, o que denota a higidez da solução empregada na origem, que está em consonância com a intelecção deste Tribunal Superior:

CONSULTA. ASSUNÇÃO À CHEFIA DO EXECUTIVO MUNICIPAL. CANDIDATURA. REELEIÇÃO. POSSIBILIDADE. SEJA QUAL FOR A CIRCUNSTÂNCIA QUE CONDUZA À ASSUNÇÃO DA TITULARIDADE DO PODER EXECUTIVO, OU POR QUALQUER LAPSO TEMPORAL QUE OCORRA, CONFIGURA O EXERCÍCIO DE MANDATO. EM HAVENDO ELEIÇÃO SUBSEQUENTE PARA ESTE CARGO SERÁ CARACTERIZADA COMO REELEIÇÃO.

(Cta nº 1538/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe de 21.5.2009 – grifei)

Ante o exposto, nego seguimento aos recursos especiais eleitorais (art. 36, § 6o, do RITSE).

Publique-se.

Brasília, 28 de abril de 2021.

Ministro TARCISIO VIEIRA DE CARVALHO NETO
Relator

Foto – Divulgação